domingo, 31 de julho de 2011

Entra, mas fecha a porta

Você acabou de fechar a porta.
Dez minutos atrás você passava por ela, dava pra ver sua feição receosa e também as intenções que perpassavam de alguém que tinha muito a falar. Permaneci em silêncio fingindo indiferença enquanto em poucas palavras você puxava conversa fiada. Tive vontade de lhe dizer para ir direto ao ponto e o motivo de estar ali, mas por alguma razão me agradava sua presença.
Motivo este, eu sabia exatamente qual era. E sabia também dos seus propósitos, sabia dos seus anseios em nos ter. Era ousado da sua parte e essa atenção me envaidecia. Não que eu gostasse, se sofria ou não, já não cabia a mim saber, mas a certeza que essas injúrias eram em vão e que o disco dessa discussão já ralou, isso sim cabia a mim saber.
Medo? Não sei. Alguma coisa impedia que a gente se comunicasse. Fraqueza da sua parte, orgulho da minha ou vice-versa. Talvez eu tenha sido a peça principal para criar essa barreira entre nós, esse lapso que impede que qualquer palavra seja dita ou que qualquer toque não pareça embaraçoso. Talvez você fique se perguntando como que a suavidade foi se perder assim.
E aí você se virou para ir embora, transpassando certa relutância na esperança de que eu pedisse pra ficar mais um pouco. Eu não pedi e você se desculpou por incomodar. Eu queria que ficasse, sem que eu pedisse, humildade nunca foi meu forte, mas aí de repente você parecia louco pra se livrar dali, da minha suposta negligência. Por qual motivo eu iria me sensibilizar com alguém que por descuido me deixou passar e nem se dar ao trabalho de fazer esforço para que eu volte?
Já a poucos passos da porta eu quis te pedir pra voltar. Em todos os sentidos. Mas me guardei, queria que essas palavras viessem da sua boca, apesar de saber que te faria feliz se eu as pronunciasse. Queria que nunca abrisse aquela porta para sair, mas os seus dedos já faziam o movimento para ir embora. Sei que me arrependeria, você também, não pela mesma causa. Você estaria arrependido por ter ido até minha casa, enfrentar o poço de ingratidão que sou, talvez concordemos nisso: pois também te acho um poço de ingratidão.
Depois de finalmente fechada à porta, fiquei imaginando a quantidade de nomes insultantes você estaria pronunciando agora a meu favor, me rogando mil pragas, não que eu não merecesse. E principalmente se insultando por ser tão absurdamente imbecil. Isso eu não merecia, eu não era digna da sua visita, e talvez estivesse mesmo certo em se ultrajar.
Uma vez perdida, a oportunidade dificilmente volta e se volta é um processo lento, mais do que minha paciência é capaz de suportar. É degradante e soa tão falso esses nossos encontros sem despedida, como se fosse “ah vai saber, um dia a gente se encontra de novo” e tanto faz. E esse tanto faz é o que mais soa falso, pelo menos pra mim. Não sei pra você.

sábado, 30 de julho de 2011

O que sobrou do amor


Não só eram contadas as histórias como compartilhávamos uma. Não sei como e nem pra onde foi parar, ela se encheu de abismos e a sua pretensão de não sair deles é o que mais dói.
De tanto ser rotulada, nossa relação acaba por cair num faz de conta que nem eu nem você entendemos. Você, todo prosa, fica mastigando as próprias indagações fazendo tudo ser uma tamanha complexidade e eu atrás tentando compreendê-las. Esse é o motivo aparente para me importar tanto. Me desperta a atenção todo esse teatro, essas lamúrias que te fazem tão imensamente mais complicado que eu. É intrigante, admito dizer até com um toque pouco masoquista.
Tenho absoluta certeza que encontrarei por aí seres humanos menos impactantes e mais agradáveis que você, talvez até cubram o espaço vago que foi deixado, nunca da forma que me satisfaça, pois me adaptei a sua aspereza. É verdade que não sinto felicidade alguma nisso tudo. De certo, o gosto em ter paz não supera os meus impulsos em te acompanhar nessas jornadas de intensa amargura, mas não sei até que ponto sou capaz de ir seguindo essa mesma trajetória que parece nunca parar.
Claro que muitas vezes já fiz promessas em deixar de lado, fracassadas pelo ímpeto de sempre voltar atrás. Quem sabe se você fosse mais piedoso e começasse me deixando de lado totalmente, eu já teria superado essa questão de vez.
Talvez eu demore pra perceber que o que eu preciso é de companhias leves e que o preço para conquistar a confiança de alguém – sobretudo a sua – é alto demais.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Tudo é tão difícil como parece

Por muito tempo, assumo dizer que vivi sobre a sombra de muitas circunstâncias. Presa em situações tão ansiadas em serem vividas, o reconhecimento de mim mesma era dado diante daquilo que eu fazia, nunca daquilo que eu realmente era. De certa forma não tenho queixas, tenho mesmo fascínio pelo meu passado, e a intensidade com que as lembranças me acolhem é devastadora. Por outro lado, a forma doentia que às vezes isso parece ser não atende muito bem ao que procuro como paz a sua maneira.
Tenho calafrios durante a noite e penso e repenso, bordo com aflições desesperadas as entrelinhas daquilo que já não é mais uma realidade. Faço-me perguntas como pra onde foi todo mundo? O que aconteceu com a gente?  E assustadoramente as mudanças recaem em cima dos meus ombros.  De repente alcançar o íntimo de alguém que já foi muito íntimo pode ser perigoso e até mesmo intimidante. E aí me vejo totalmente desencorajada pra seguir em frente e com preguiça de retomar minhas vontades.